Escravidão: a abolição na aula de História

Publicado por Caroline Dähne em

Hoje, 13 de maio, completam-se 133 anos da Abolição da Escravidão no Brasil. Essa certamente é uma temática bastante abordada nas aulas de História, assim como em vestibulares e no Enem.

Pensando nisso, elaboramos algumas dicas sobre como abordar a temática da Abolição em sala de aula. Assim, acrescentamos também algumas dicas de materiais de apoio que podem ser utilizados como recursos didáticos pelos professores.

Elaborando uma aula sobre a Abolição da Escravidão:

No entanto, não vamos colocar aqui um plano de aula completo sobre o tema, e sim várias dicas que os professores podem utilizar na hora de elaborar suas aulas sobre a Abolição da Escravidão. Nesse sentido, abaixo listamos alguns tópicos de temas que não podem faltar na discussão sobre a temática, não necessariamente em uma ordem de relevância.

Contexto anterior à Abolição da Escravidão

Para que os alunos compreendam a complexidade do processo da abolição da escravidão no Brasil, certamente a aula precisa começar antes da assinatura da Lei Áurea.

Para isso, o ideal é que o conteúdo seja abordado na sequência das temáticas sobre o Segundo Reinado. Assim, os alunos terão uma noção mais completa sobre como era a sociedade brasileira na época e o nosso cenário político e econômico.

Certamente, além do cenário nacional, é importante reforçar qual era o cenário mundial no século XIX. Nesse sentido, não é necessário levar muito tempo demonstrando o que estava acontecendo no restante do mundo, já que iremos salientar alguns aspectos ao longo da aula ou das aulas. Desse modo, apenas de forma introdutória comentar sobre como a escravidão era tratada em outros lugares na época.

História de resistência à Escravidão

Procure salientar com os alunos que a abolição da escravidão não proveio do “coração bondoso” da Princesa Isabel ou de um ato generoso do governo. É importante nesse sentido demonstrar que as resistências à escravidão no nosso território são bem anteriores a esse processo.

Assim, se não tiver abordado ainda com os alunos em aulas anteriores, procure demonstrar todas as alternativas feitas por escravizados ou abolicionistas ao longo dos séculos na tentativa de acabar com essa prática. Nesse sentido, evidencie as resistências, citando revoltas, fugas, criação de quilombos e movimentos que demonstram a luta das pessoas que foram escravizadas para se libertar desse sistema escravocrata no Brasil.

Reconheça a participação do movimento abolicionista

Ainda nessa ideia de mostrar a pluralidade das lutas que aconteceram no cenário do fim da escravidão no país, saliente a participação dos abolicionistas nesse processo. Demonstre a quantidade de associações abolicionistas que estavam surgindo nesse período e como era a ação das pessoas que se envolviam nessa luta.

Faça com que os alunos percebam a ação dos jornalistas empenhados na criação de poemas, panfletos e notícias que divulgassem sobre a necessidade da abolição. Assim como o trabalho de advogados que representavam os escravizados na justiça e os de políticos que levavam essas discussões às votações. Trabalhe biografias de líderes abolicionistas brasileiros com os alunos, mostre que são diversos os protagonistas nesse processo pelo fim da escravidão no país.

Desconstrua a ideia da Princesa Isabel como a “Redentora”

É importante que os alunos percebam que o discurso de que a Princesa Isabel agiu pelo “coração” e foi a “redentora” dos escravizados no Brasil foi criado com intenções políticas na época. E reforçado posteriormente, na tentativa de criar para ela a imagem de heroína brasileira.

Demonstre para os alunos quais interesses políticos e econômicos estavam em jogo naquele período caso a escravidão fosse mantida pelo governo. Saliente que esse ato da assinatura da Lei Áurea foi uma tentativa de manutenção do Império e de talvez um Terceiro Reinado.

Para isso, utilize diferentes visões sobre a assinatura da Lei Áurea, como os trechos de textos abaixo. Os quais podem ser analisados juntamente com os alunos para perceber as diferentes visões sobre o mesmo processo. E questionar a quem favorecia a narrativa da princesa como “redentora”.

Material de análise:
Texto 1

E é com bela caneta de ouro que ela assina a lei que a Nação enternecida cognominou de “áurea”. Na rua, a multidão em altos brados exige a presença de Isabel. E a princesa aparece à janela, tendo ainda na mão a pena que acabou de dar a liberdade à raça negra do Brasil. Na praça inteira, o povo agita os braços festivamente, em pleno delírio: Redentora! Redentora! Redentora! E, quando o estridor da rua se vai apagando, no salão uma voz se alteia, num brado que a todos surpreende: Meu Deus! Meu Deus! Já não há mais escravos em nossa terra (…)

O que se segue depois que Isabel, com sua assinatura, sanciona a lei, são festas, mais festas na cidade inteira, em todas as cidades, em todo o país. Festas durante dias seguidos, durante meses. Festas nas ruas, festas nos corações. Festa no coração dos negros, que ficaram livres do cativeiro que os atormentava. Festa também no coração dos brancos, que livres ficaram da nódoa que lhes desonrava a Pátria.

CORRÊA, Viriatto. História da liberdade no Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974, p. 203-204. In: VICENTINO, Cláudio. Viver a História. São Paulo:Scipione, 2005, p. 297.
Texto 2

O título de “Redentora”, consagrado pelos áulicos da História oficialista à Princesa Isabel, não passa de mais uma falácia com que se costuma enganar nossos estudantes de História. A Abolição não proveio do bondoso coração da regente. Foi produto de uma luta violenta, sangrenta, cheia de heróis anônimos. Foi produto também do desespero de uma monarquia decrépita, já desprovida de bases de apoio social, condenada, e que agiu como o afogado: agarrou-se a uma palha. Só que já era tarde demais. 

MENDES, Jr., Antônio e MARANHÃO, Ricardo. Brasil história: texto e consulta. República Velha. São Paulo: Brasiliense, 1983, p.127-8. In: VICENTINO, Cláudio. Viver a História. São Paulo: Scipione, 2005, p. 297.
Texto 3

“A Lei Áurea era mesmo popular e conferia nova visibilidade à princesa Isabel e à Monarquia. No entanto, politicamente, o Império tinha seus dias contados ao perder o apoio dos fazendeiros do Vale do Paraíba. Apesar do clima de euforia reinante, parecia ser o último ato do teatro imperial. […]. Nos jornais e nas imagens da época, Isabel passa a ser retratada como uma santa a redimir os escravos, que aparecem sempre descalços e ajoelhados, como a rezar e a abençoar a padroeira. Já a princesa surge de pé e ereta, contrastada com a posição curvada e humilde dos ex-escravos, que parecem manter a sua situação – se não mais real, ao menos simbólica. Aos escravos recém-libertos só restaria a resposta servil e subserviente, reconhecedora do tamanho do “presente” recebido. Estava inaugurada uma maneira complicada de lidar com a questão dos direitos civis.

Sem a compreensão de que a abolição era resultado de um movimento coletivo, permaneceríamos atados ao complicado jogo das relações pessoais, suas contraprestações e deveres: chave do personalismo e do próprio clientelismo. Nova versão para uma estrutura antiga em que as relações privadas se impõem sobre as esferas públicas de atuação. Como se fôssemos avessos a qualquer associação com a violência, apenas reproduzimos hierarquias que, de tão assentadas, pareciam legitimadas pela própria natureza. Péssima lição de cidadania: a liberdade combinada com humildade e servidão, distante das noções de livre-arbítrio e de responsabilidade individual. ”

SCHWARCZ, Lilia. Abolição como Dádiva. In: FIGUEIREDO, Luciano (org.) A Era da Escravidão. Rio de Janeiro: Sabin, 2009, p. 88-90.

Fatores externos

Além da pressão interna que o governo imperial sofria dos grupos abolicionistas, demonstre aos alunos como a pressão internacional também colaborou para o fim da escravidão no país.

Saliente, principalmente, a ação da Inglaterra nesse processo. Explique sobre a pressão feita pelo país, inclusive com a criação da Lei Bill Aberdeen em 1845, na qual a marinha britânica agia contra o tráfico negreiro.

Para que os alunos percebam os motivos pelos quais a Inglaterra realizou essa pressão, relacione a ideia de escravos como não consumidores, o que não era compatível com o Capitalismo Industrial.

Demonstre também as tentativas anteriores do governo brasileiro com a criação das Leis Abolicionistas que na prática não eram totalmente cumpridas. Nesse sentido, trabalhe o ditado “para inglês ver”.

Leis Abolicionistas

Décadas antes da Abolição da Escravidão já vemos o surgimento de leis que procuravam diminuir as pressões, tanto internas quanto externas, que o governo estava sofrendo. Para que os alunos percebam as estratégias do governo, utilize como atividade a elaboração de uma linha do tempo com legislações anteriores à Lei Áurea.

Nesse sentido, busque mostrar para os alunos que mesmo com a criação dessas leis, na prática muitas pessoas que teoricamente seriam livres continuavam sendo escravizadas. Como por exemplo, a Lei do Ventre Livre (1871), na qual o bebê nascia livre mas continuava morando e trabalhando no local em que a mãe era escravizada.

Brasil: o último a abolir a Escravidão

Demonstre que o Brasil foi o último país da América a abolir a escravidão. Assim os alunos irão perceber como o governo imperial resistiu em decretar o fim da escravidão em nosso território.

Material de análise:

Para isso, utilize mapas e gráficos com as datas das abolições. Como o mapa abaixo, por exemplo:

GEOPIZZA. Data das Abolições da Escravidão nas Américas. 2017. Disponível em: https://m.facebook.com/Geopizza/photos/a.1556276114668602/1696929407269938/?type=3  

Pós-abolição da Escravidão

Além de ressaltar o processo da abolição, é muito importante que o professor de História trabalhe com os alunos o contexto do pós-escravidão. Para que não fique parecendo que o final da escravidão resolveu todos os problemas dos escravizados.

Aponte que a legislação não previu nenhum tipo de indenização nem de recolocação na sociedade. O que fez com que muitos deles permanecessem nos lugares que anteriormente trabalhassem, ou migrassem sem direção nem perspectiva. 

Material de análise:

Certamente uma opção de atividade é realizar a análise da Legislação sancionada em 1888. Na imagem abaixo, a manchete do jornal noticia a Abolição da Escravidão. Assim, com a leitura desse material é possível questionar aos alunos como foi a manifestação da imprensa sobre a criação da legislação. E com pesquisa complementar, perceber como foi a aplicação da lei na prática.

GAZETA DE NOTÍCIAS, Extincção da Escravidão, 14 de maio de 1888. Disponível em: https://www.em.com.br/app/noticia/especiais/educacao/enem/2016/05/13/noticia-especial-enem,762306/128-anos-da-abolicao-da-escravidao-no-brasil.shtml 

No link abaixo você encontra a Lei na íntegra: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim3353.htm 


Assim para complementar a discussão, um ótimo recurso didático para analisar com os alunos são as charges. Nesse sentido, existem diversas que trabalham essa ideia do contexto do pós-abolição e até mesmo as consequências que esse cenário traz até hoje para a nossa sociedade.

Para ter acesso à charges nesse sentido, acesse nosso texto abaixo, que traz diversas charges sobre o tema e dicas de como abordá-las em sala de aula:

O cartaz abaixo também pode ser utilizado na análise das representações feitas após à Abolição da Escravidão. É importante questionar aos alunos qual o intuito dessas imagens e o que realmente estava acontecendo com as pessoas que tinham sido escravizadas no nosso país.

Arquivo Nacional, Cartaz comemorativo da Abolição da Escravidão no Brasil, 1888. Domínio Público. Disponível em: https://www.reddit.com/r/brasil/comments/833nat/cartaz_comemorando_a_aboli%C3%A7%C3%A3o_da_escravid%C3%A3o_no/ 

Exercícios do Enem

Se você trabalha com turmas do Ensino Médio, outra dica é demonstrar como é feita a abordagem do tema da Abolição da Escravidão em processos seletivos como vestibulares e Enem. Nesse sentido, ressalte para os alunos que a temática referente à Escravidão e à Abolição está entre as mais cobradas nas provas do Enem dos últimos anos.

Assim, abaixo, deixamos uma questão como exemplo para trabalhar com os alunos.

Assim, com essa questão, o professor pode evidenciar a representação positiva da Princesa Isabel, expressa na letra do samba-enredo. Além de demonstrar que o comando da questão já questiona essa visão do ponto de vista da historiografia.

Nesse sentido, analise cada alternativa com os alunos relacionando com o texto de apoio, o comando da questão e a perspectiva histórica.

A alternativa correta dessa questão é a letra B.

Conclusão:

Certamente existem diversos materiais de análise que podem ser utilizados quando se trata da Abolição da Escravidão no Brasil, cabe ao professor escolher o que melhor se adapta ao nível e série dos seus alunos. 

Assim, com essas dicas, esperamos contribuir com o trabalho dos nossos colegas na elaboração de suas aulas e atividades sobre a temática. Lembrando que esse conteúdo não se esgota apenas com os apontamentos que trouxemos, mas que eles são fundamentais para a compreensão desse processo histórico.

Usou alguma de nossas dicas? Nos conte nos comentários. 

Até a próxima!


Caroline Dähne

Mestre em História, Cultura e Identidades e graduada em Licenciatura em História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Desenvolve pesquisas relacionadas a Segunda Guerra Mundial, Discursos jornalísticos, Patriotismo e Nacionalismo, Imprensa brasileira e Propagandas de guerra. Atualmente atua como professora de História na rede particular de ensino na cidade de Curitiba-PR.

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